Revisado por: Elaine S. da Luz, coordenadora de comunicação e redação da ANAPRI
As redes internacionais de cidades configuram-se como uma das iniciativas recentes dos governos subnacionais para se projetarem internacionalmente, pelas quais as cidades atuam como centros – ou “nós”, nos dizeres de Castells – de compartilhamento de iniciativas de boas práticas em políticas públicas, discutem planos de ação e cooperam em torno de objetivos comuns. O espaço adequado para isso são as redes internacionais de cidades, que estabelecem uma agenda partilhada para que os governos locais atuem conjuntamente em constante conexão.
Nessa série de posts sobre as redes de cidades, iniciaremos apresentando uma das mais importantes, especialmente para nós da região da América do Sul: as Mercocidades.
A Rede Mercocidades é uma rede de cidades fundada em 11 de novembro de 1995, logo nos primeiros anos de criação do Mercado Comum do Sul (Mercosul), num movimento que reuniu gestores de municípios dos países-membros do bloco em certa contestação do tom fortemente comercial em que o processo de integração se pautava. Apesar disso, as Mercocidades não fazem parte do organograma oficial do bloco, abrigando ainda cidades-membros de países que não são membros plenos do Mercosul. Seu objetivo é aprofundar a integração regional com a participação decisória dos governos subnacionais, além de incentivar a cooperação horizontal entre as cidades-membros e o mundo.
Algumas das principais atividades da Rede são a realização de reuniões, o estabelecimento de projetos e parcerias, dentre os quais destaca-se o Programa de Cooperação Sul-Sul, firmado a partir de 2016, com fins de alcançar um “marco procedimental” para cooperação sul-sul e a liderança da Rede no processo, além de posicioná-la como um ator promotor de cooperação internacional, segundo o seu site oficial.
Durante a pandemia, as Mercocidades também tiveram atuação proeminente com a iniciativa ‘Mercocidades responde ao COVID-19’, em que realizaram seminários online e cooperação com universidades públicas na disponibilização de recursos científicos e tecnológicos para o combate ao vírus.
Em termos de atuação para o profissional de Relações Internacionais, a Rede pede que haja um Responsável de Mercocidades definido pelo próprio governo local, a fim de representar os interesses e demandas da cidade frente à Rede, estabelecendo contatos e trazendo também os encaminhamentos dos projetos das Mercocidades às próprias áreas correlatas com a administração local.
Um fato curioso é que a não-formalização da Rede junto ao aparato do Mercosul lhe confere uma dupla característica quanto à sua atuação: ao mesmo tempo que as Mercocidades têm certa autonomia para desenvolver suas atividades – já que não depende das instâncias superiores do bloco regional –, a falta de institucionalização no Mercosul mina a capacidade decisória das Mercocidades, de modo que pode-se dizer que elas atuam de forma “extra” – diferentemente do Foro Consultivo de Municípios, Estados Federados, Províncias e Departamentos (FCCR), de 2004, este, sim, parte integrante da instituição regional.
Ainda assim, é inegável o pioneirismo das Mercocidades em trazer o debate subnacional para a agenda de integração regional, expandindo o leque de temas de atuação e conformando-se, assim, como a mais importante rede de cidades do continente sul-americano.
Referências
DESSOTTI, Fabiana; PRADO, Ivan. Redes internacionais de cidades: mecanismo de inserção internacional das cidades na busca do desenvolvimento local. V Congreso Latinoamericano de Ciencia Política. Asociación Latinoamericana de Ciencia Política, Buenos Aires, 2010.
JUNQUEIRA, Cairo. A Cooperação Subnacional no Mercosul: os casos das Mercocidades e do FCCR. Brazilian Journal of International Relations, Marília, SP, v. 3, n. 1, p. 146–169, 2014. DOI: 10.36311/2237-7743.2014.v3n1.p146-169. Disponível em: https://revistas.marilia.unesp.br/index.php/bjir/article/view/3343. Acesso em: 24 nov. 2023.
______. A atuação da Rede Mercocidades em meio à crise do regionalismo sul-americano e à pandemia de COVID-19. Observatório de Regionalismo-ODR, 25 ago. 2020. Disponível em: http://observatorio.repri.org/2020/08/25/a-atuacao-da-rede-mercocidades-em-meio-a-crise-do-regionalismo-sul-americano-e-a-pandemia-de-covid-19/. Acsso em: 22 nov. 2023.
MERCOCIDADES. Guía de participação e responsabilidades Mercocidades. Mercociudades, 2018. Disponível em: <https://mercociudades.org/descarga/guia-de-participacao-e-responsabilidades-mercocidades-2/>. Acesso em: 24 nov. 2023.
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OBSERVATÓRIO DE COOPERACIÓN CIUDAD-UNIVERSIDAD – OBC. COVID-19: Aportes desde las Universidades y Gobiernos Locales. Observatorio de Cooperacion Ciudad-Universidad, 2023. Disponível em: <http://obc.grupomontevideo.org/node/270>. Acesso em: 24 nov. 2023.